quinta-feira, 22 de julho de 2010

Aqui se sentou Zaratustra


A árvore isolada.


"Quando Zaratustra fez trinta anos, abandonou a sua pátria e o lago da sua pátria, retirando-se para a montanha. Ali viveu, nutrindo-se da sua sabedoria e solidão, e dez anos passaram sem que ele de tal se fatigasse. Mas sucedeu que se lhe mudou o coração, e uma manhã, tendo-se erguido com a aurora, apresentou-se diante do sol e falou assim:
- Ó grande astro! que felicidade poderia ser a tua se não tivesses aqueles a quem iluminas?
Há dez anos que sobes até à minha caverna; estarias fatigado da tua luz e desse trajecto, se aqui não estivéssemos eu, a minha águia e a minha serpente.
Mas cada manhã te esperávamos, para tomar o que te é supérfluo e por ele te dar graças.
Vê: eis-me saturado da minha sabedoria, como a abelha que fabricou demasiado mel; sinto a necessidade de mãos estendidas para mim.
Queria dar, prodigalizar a minha sabedoria, até ao dia em que os sábios de os homens se sentissem felizes na sua loucura, e os pobres felizes na sua riqueza.
Para tal deverei descer aos abismos, como todas as noites o fazes, ó astro transbordante de riqueza, para ires levar a tua luz ao mundo subterrâneo.
Como tu deverei declinar, como dizem os homens junto dos quais quero descer.
Abençoa-me pois, olho manso que até o excesso de felicidade sabes encarar sem inveja!
Abençoa esta taça que vai transbordar, e que o seu oiro, escorrendo, a toda a parte leve o reflexo da tua felicidade.
Vê: esta taça aspira a estar uma vez mais viva, Zaratustra aspira a ser de novo homem.
Assim começou o declínio de Zaratustra."

(Assim falava Zaratustra - Friedrich Nietzsche)

Portas que desenham a História


Passagem que limita o espaço exterior, criando um interior. Permite o encerramento de coisas, pessoas e História. Ajuda no desenho da vida.



"A história, sobretudo, sem querer ofender, E a pintura e a música, A música anda a resistir desde que nasceu, ora vai, ora vem quer livrar-se da palavra, suponho que por inveja, mas regressa sempre à obediência, E a pintura, Ora a pintura não é mais do que uma literatura feita com pincéis, Espero que não esteja esquecido de que a humanidade começou a pintar muito antes de saber escrever, Conhece o rifão, se não tens cão caça com gato, por outras palavras, quem não pode escrever pinta ou desenha, é o que fazem as crianças, O que você quer dizer, por outras palavras, é que a literatura já existia antes de ter nascido, Sim senhor, como o homem, por outras palavras, antes de ser já o era."

(História do Cerco de Lisboa - José Saramago)

sexta-feira, 9 de julho de 2010

For today I am a boy...


"One day I'll grow up and feel the power in me.
Onde day I'll grow up... of that I'm sure.
One day I'll grow up and know whom within me.
One day I'll grow up, feel it full and pure.

But for today... I am a boy."

(Antony and the Johnsons - For today I am a boy)

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Solo


"Tenho saudades do tempo em que falavamos sobre estas coisas... Agora tenho de conversar sozinha. Só a pedra inerte e quase inalterável ouve os meus suspiros."


sábado, 3 de julho de 2010

Velha Drave


(Foto de António Cruz)

É estranho quando parece que conseguimos voltar atrás no tempo sem grande dificuldade... faz-nos parecer que podemos fazer isso sempre que quisermos. Hoje tive essa experiência. Visitei a antiga Aldeia da Drave, fundada em 1527 (ou pelo menos é deste ano que data o primeiro documento relativo a Drave). É longe...muito longe de qualquer outra aldeia, mesmo a mais próxima (Regoufe) dista dela cerca de 1o km de um caminho de terra batida de pequenas (grandes) pedras, cheio grandes subidas e precipituosas descidas. Mas vale mesmo a pena. Segundo li, trata-se de uma aldeia fundada por um casal... cuja família foi aumentando com o passar dos anos, sendo que todos os antigos habitantes faziam parte dos Martins da Drave.

Esta aldeia localiza-se, mais precisamente no Maciço da Gralheira, a cerca de 600 metros de altitude, bem encaixada num vale entre as Serras da Freita e Arada. Existe uma grande escassez de acessos, facto que contribuiu para o abandono deste espaço, mas ao mesmo tempo para uma (óptima) conservação das casas e materiais diversos que ainda conseguimos encontrar por lá.

A aldeia em questão assenta sobre um solo xistoso, facilmente extraível e trabalhável, sendo por isso o material primário das variadíssimas casas, currais e outros dispositivos de sobrevivência existentes. Existem cerca de 50 construções identificáveis, todas elas sem qualquer tipo de decoração, seja ela de azulejo, caixilho, alumínio... O aglomerado confunde-se, então com a paisagem envolvente, sendo caracteristicamente de pequena dimensão, amontoado ou justaposto. As tipologias de casas encontradas encontram-se directamente ligadas e condicionadas, principalmente, pelas necessidades e poder económico do proprietário, sendo bem visível a ligação das casas com a vida do campo e a guarda de animais (genericamente casa elementar de pouco mais do que uma divisão, com alçado: habitação - primeiro piso; currais - piso inferior).

É possível encontrarem-se, também, vários espaços comuns, tais como quintais ou pátios privados grandes eiras, arruamentos principais e secundários... grandes espigueiros... A aldeia encontra-se totalmente desabitada, contudo, algumas das casas ainda se encontram repletas de instrumentos do dia a dia... chávenas, bules, arados, teares (a casa grande desta aldeia tinha uma divisão dedicada à tecelagem e ainda hoje lá está o tear montado!), grandes pias, lagares, rodas de lagares, cortiços... tanta coisa, mesmo! Uma das casas tem, na cozinha, grande parte dos poucos móveis que a constituíam, mesa, banco, forno...

Visitem...é uma delicia!!!

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Sandy Denny & The Strawbs - Sail away to the sea




Com o passar dos anos alteramos os tempos e a vontade. Simplesmente, olhamos para trás e vemos que algumas das coisas que nos acompanhavam e que sempre tomamos por garantidas...já não fazem sentido no nosso presente...porque já não somos quem éramos há 5 minutos atrás. Contudo, há coisas que sempre caminham do nosso lado...mesmo que sob a forma de um vulto, dentro de uma casa sombria e abandonada.

Tenho saudades do passado...mas estou ansiosa pelo meu e nosso presente e futuro... mas enquanto espero vou organizando a minha banda sonora oficial.

"Quão pouco é preciso para ser feliz! Sem música, a vida seria um erro!"
(Nietzsche: 1844 - 1900)